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Um Tratado Sobre Ana Clara (personagem do livro “As Meninas” de Lygia Fagundes Telles)


“Tive uma personagem que recorreu à máscara para não ser descoberta, quis voltar num outro texto e usou um disfarce, assim como faz qualquer ser humano para mudar de identidade“


Lygia Fagundes Telles

Durante aquele estranho chá




Ana Clara fatos:


- Morreu jovem

- Era linda e tinha a vida inteira pela frente

- Apaixonou-se por uma menina e queria dar a ela um coelhinho, uma bicicleta e um ovinho de pomba. (Pg: 136)

- Ao namorado posterior disse que se tivesse uma filha iria se chamar Mecânica Celeste. (Pg: 53)


Nem em uma, nem em duas mas em várias palestras e depoimentos Lygia confessou que sofreu muito com a morte de Ana Clara, que acabou de escrever o livro “As Meninas” aos prantos e que muitas vezes chegou a sonhar com Ana Clara pedindo a ela mais uma chance.


Rosa Ambrósio do romance ”As Horas Nuas“ e Luisiana do conto “Apenas Um Saxofone” são duas mulheres mais velhas com o mesmo perfil psicológico de Ana Clara, que gostam de beber como a Ana Clara gostava e que são obcecadas pela juventude.


Ana Clara queria ir para frente enquanto essas duas querem voltar para trás.


Rosa Ambrósio na página 22 do livro “As Horas Nuas” diz: “Como seria bom se pudéssemos nos organizar com o equilíbrio das estrelas, tão exatas em suas constelações. Mas parece que a graça está na meia luz, na ambiguidade”.Fala de Gregório ( o namorado que já morreu ) e da Mecânica Celeste.


Luisiana no conto “Apenas Um Saxofone” diz que possui um diamante do tamanho de um ovo de pomba.


Coincidências ou isso não seria a Lygia atendendo ao pedido de Ana Clara para retornar?

Não seria a própria Ana Clara na pele de Luisiana e possuindo o mesmo ovo de pomba agora transmutado em um diamante?

Não seria também a própria Ana Clara reencarnada na Rosa que amava, que hoje é Rosa Ambrósio se reorganizando no equilíbrio das estrelas? Mecânica Celeste!

Ana Clara dividiu-se em duas. Equilibrou-se em duas. Virou Rosa Ambrósio, virou Luisiana, virou estrela e virou diamante.


Assim conversa a obra da Lygia entre si. Uma certa Lorena do romance “As Meninas” assim como uma certa Romana do conto “Tigrela” possuem o mesmo colar de âmbar que dá duas voltas no pescoço.

Um certo Paul Karsten do conto “Helga” que fugiu para Hamburgo pode ser o mesmo Herr Paul que veio parar no Brasil e virou o seu Pô do romance “As Meninas”.

Uma certa Rosa Ambrósio diz que a graça está na meia luz, na ambiguidade enquanto um certo Ricardo do conto “Venha Ver o Pôr-do-Sol” diz à uma certa Raquel:


”Ah Raquel, olha um pouco para esta tarde! Deprimente o que? Não sei onde foi que eu li que a beleza não está nem na luz da manhã nem na sombra da noite. Está no crepúsculo, nesse meio tom, nessa ambiguidade.”


E aí é que esta a beleza das palavras e dos símbolos. Na mescla. Na ambiguidade. Nas entrelinhas. Da mesma forma como funciona a mecânica das cartas de tarot, na qual as coisas precisam ser decifradas, o bom texto não revela tudo de uma vez. É saboreando devagar que iremos enxergar a beleza do crepúsculo, da juventude e de uma certa jovem que virou uma estrela e um diamante.




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